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Práticas comerciais desleais e proibidas para empresas do setor agroalimentar


Desde dia 1 de novembro que se começaram a aplicar-se novas regras às relações entre empresas na cadeia de abastecimento agrícola e alimentar, na sequência da transposição de uma diretiva da União Europeia sobre práticas comerciais desleais.

Os contratos de fornecimento que estiverem a vigorara a 1 de novembro mantêm-se válidos, à exceção de cláusulas que estejam em desconformidade com as novas regras, que serão nulas.

Regime aplicável às práticas individuais restritivas do comércio

Quanto ao regime aplicável às práticas individuais restritivas do comércio, são proibidas várias práticas negociais do comprador, nomeadamente a notificação do cancelamento de encomendas de produtos perecíveis num prazo inferior a 30 dias antes da data prevista de entrega, ou seja, produtos que possam tornar-se impróprios para venda no prazo máximo de 30 dias após a sua colheita, produção ou transformação.

Três condutas passam a considerar-se como práticas negociais abusivas:

  • as que resultam na penalização de fornecedor pela dificuldade de fornecimento de encomendas desproporcionadas face às quantidades normais do consumo do adquirente ou aos volumes habituais de entregas do vendedor;
  • a aquisição, utilização ou divulgação ilegais de segredos comerciais do fornecedor;
  • a ameaça ou concretização de atos de retaliação comercial contra o fornecedor que exerce os seus direitos contratuais ou legais.

Passa a constituir contraordenação muito grave a violação do dever de reduzir a escrito as disposições sobre as condições em que uma empresa obtenha uma remuneração financeira ou de outra natureza dos seus fornecedores, como contrapartida da prestação de serviços específicos.

As empresas ou associações podem apresentar denúncia sobre as práticas restritivas proibidas em nome dos seus associados.

Definição de prazos de pagamento máximos para efeitos de pagamento do preço nos contratos de compra e venda ou de fornecimento de bens alimentares destinados ao consumo humano

Em matéria de prazos de pagamento do preço nos contratos de compra e venda ou de fornecimento de bens alimentares, prevê-se qual a documentação necessária para efeitos de prova do cumprimento do pagamento do preço nestes contratos, designadamente as guias de remessa e as faturas; a documentação deve ser mantida em arquivo físico ou digital por um período de três anos e disponibilizada à entidade fiscalizadora mediante solicitação.

 Por outro lado, passam a prever-se contraordenações económicas graves, puníveis nos termos do novo Regime Jurídico das Contraordenações Económicas (RJCE) para o incumprimento de:

  • regras relativos aos prazos de pagamento de produtos agrícolas e alimentares;
  • regras relativas à manutenção em arquivo físico da documentação para efeitos de prova do cumprimento;
  • a não prestação ou a prestação de informações falsas, inexatas ou incompletas em resposta a pedido da entidade fiscalizadora.

Denúncia e investigação de práticas restritivas do comércio

A entidade fiscalizadora procede à investigação e desencadeia as ações inspetivas que entenda necessárias ao apuramento da verdade e à prossecução do interesse público na repressão de práticas restritivas do comércio.

Os denunciantes, sejam empresas ou associações que, em nome dos seus associados, apresentem denúncia sobre práticas restritivas proibidas têm direito à confidencialidade sobre a sua identidade, ou sobre a identidade dos associados em causa, exceto perante a entidade fiscalizadora.

O fornecedor pode apresentar queixa à autoridade competente do Estado-Membro em que está estabelecido ou à autoridade competente do Estado-Membro no qual está estabelecido o comprador suspeito de práticas individuais restritivas do comércio. A autoridade a quem for endereçada a denúncia ou queixa é responsável pela tramitação do respetivo processo.

A disponibilização à entidade fiscalizadora das informações, documentos e demais elementos necessários à investigação não constitui incumprimento de qualquer dever de segredo imposto por regulamento ou contratualmente estabelecido.

Recebida uma queixa a entidade fiscalizadora informa o denunciante, dentro de um prazo razoável após a sua receção, sobre se foi, ou não, dado seguimento à mesma. Poderá abster-se de adotar as medidas para a cessação da prática negocial proibida, caso exista o risco de estas revelarem a identidade do queixoso ou de divulgar qualquer outra informação que o queixoso considere lesiva dos seus interesses, desde que este tenha identificado as informações para as quais solicitou confidencialidade e assim o exija.

São práticas negociais abusivas que passam a ser proibidas entre empresas que se traduzam:

  • Na penalização do fornecedor pela dificuldade de fornecimento de encomendas desproporcionadas face às quantidades normais do consumo do adquirente ou aos volumes habituais de entregas do vendedor, quando o fornecimento que, em condições normais, seria concluído o não puder ser, por motivos imprevistos e de força maior, recaindo sobre o fornecedor o ónus de provar esse impedimento;
  • Na aquisição, utilização ou divulgação ilegais de segredos comerciais do fornecedor, como tal configuradas no Código da Propriedade Industrial;
  • Na ameaça ou concretização de atos de retaliação comercial contra o fornecedor que exerce os seus direitos contratuais ou legais, nomeadamente ao apresentar uma queixa às autoridades competentes ou ao cooperar com as autoridades competentes no decurso de uma investigação;
  • As práticas negociais do comprador que se traduzam em impor um pagamento, diretamente ou sob a forma de desconto.

Alterações nas práticas negociais no setor agroalimentar

O regime dos prazos de vencimento máximos para efeitos da obrigação de pagamento do preço nos contratos de compra e venda ou de fornecimento de produtos agrícolas e alimentares é aplicável:

  • aos contratos celebrados com fornecedores singulares ou coletivos do setor agroalimentar cujo volume de negócios anual não exceda os 350 milhões de euros, independentemente do Estado-Membro da União Europeia em que estejam estabelecidos, bem como às organizações de produtores e respetivas associações reconhecidas;
  • todos os contratos celebrados com compradores singulares ou coletivos de produtos agrícolas e alimentares ou agrupamentos destes, independentemente do Estado-Membro da União Europeia em que se encontrem estabelecidos, ou com compradores que sejam entidades públicas, entendendo-se como tal os serviços e entidades que integram a administração direta, indireta e autónoma do Estado, incluindo os serviços e entidades da administração regional, local e associações públicas sujeitos a um regime de direito público.

Tratando-se de produtos agrícolas ou alimentares perecíveis e não perecíveis entende-se por produtos agrícolas e alimentares perecíveis os produtos agrícolas e alimentares que, pela sua natureza ou devido à sua fase de transformação, são suscetíveis de se tornar impróprios para venda no prazo de 30 dias após a data de colheita, produção ou transformação.

A partir de 1 de novembro são proibidas as práticas negociais do comprador nas transações comerciais que tenham por objeto produtos agrícolas ou alimentares:

  • perecíveis que se traduzam no pagamento do preço após o decurso do prazo de 30 dias;
  • não perecíveis que se traduzam no pagamento do preço após o decurso do prazo de 30 dias ou após o decurso do prazo de 60 dias.

Os fornecedores e compradores abrangidos são os seguintes:

Fornecedores com volume anual de negócios Compradores com volume anual de negócios
até 2.000.000 euros acima dos 2.000.000 euros
entre 2.000.000 euros e 10.000.000 euros acima dos 10.000.000 euros
entre 10.000.000 euros e 50.000.000 euros acima dos 50.000.000 euros
entre 50.000.000 euros e 150.000.000 euros acima dos 150.000.000 euros
entre 150.000.000 euros e 350.000.000 euros acima dos 350.000.000 euros

Estas proibições não se aplicam quando o comprador seja uma empresa do setor da restauração e bebidas (mantêm-se os mesmos parâmetros de volume anual de negócios).

Os prazos são contados a partir da entrega efetiva dos bens ou da apresentação da respetiva fatura, na qual devem estar apenas indicados os produtos alimentares, consoante o que ocorrer em momento posterior, ou a contar do final do período a que se reporta o resumo de faturas, caso tenha sido acordada esta prática, e desde que este período não exceda 20 dias, ou 50 dias nos casos em que estejamprevistos 60 dias.

O volume anual de negócios dos fornecedores e dos compradores deve ser entendido de acordo com a recomendação da Comissão relativa à classificação das micro, pequena e média empresa, incluindo as definições de «empresa autónoma», «empresa parceira» e «empresa associada», e outras questões relacionadas com o volume anual de negócios.

O incumprimento da obrigação de pagamento do preço no prazo de vencimento faz acrescer à taxa supletiva de juro moratório fixada no Código Comercial ou à taxa de juro convencionada no montante de 2%.

Exceções relativas ao prazo de pagamento no setor agroalimentar

O disposto sobre os prazos de pagamento de produtos agrícolas e alimentares não prejudica a aplicação de medidas contra os atrasos de pagamento nas transações comerciais, que se aplicará supletivamente, nem a possibilidade de as partes acordarem uma cláusula de partilha de valor prevista no Regulamento que estabelece uma organização comum dos mercados dos produtos agrícolas.

Na cláusula de partilha de valor os agricultores, incluindo as associações de agricultores, e o seu primeiro comprador podem acordar cláusulas de partilha de valor, incluindo os ganhos e as perdas registados no mercado, para determinar a forma como qualquer evolução dos preços pertinentes de mercado dos produtos em causa ou de outros mercados de matérias-primas deve ser repartida entre eles.

Também não se aplica aos pagamentos efetuados no âmbito do regime escolar nem aos contratos celebrados por entidades públicas que prestem cuidados de saúde e estejam devidamente reconhecidas como tal.

Práticas individuais restritivas do comércio

No caso de práticas negociais proibidas no setor agroalimentar são ainda proibidas as seguintes práticas negociais do comprador nas transações comerciais que tenham por objeto produtos agrícolas ou alimentares:

  • Notificação do cancelamento de encomendas de produtos perecíveis num prazo inferior a 30 dias antes da data prevista de entrega, entendendo-se como perecíveis os produtos suscetíveis de se tornarem impróprios para venda no prazo máximo de 30 dias após a sua colheita, produção ou transformação;
  • Alteração unilateral do contrato relativamente à frequência, método, local, calendário ou volume do fornecimento ou entrega, assim como das normas de qualidade, preços, condições de pagamento ou prestação dos serviços intrinsecamente associados ao contrato, nos termos das novas regras para práticas negociais sujeitas a acordo no setor agroalimentar;
  • Imposição de pagamentos, diretamente ou sob a forma de desconto:
    - não relacionados com a venda de produtos agrícolas ou alimentares do fornecedor;
    - pela deterioração, perda ou desperdício de produtos do fornecedor que ocorra nas instalações do comprador, após a transferência da sua propriedade para o comprador, exceto quando o comprador demonstre que tal se deve a negligência, dolo ou incumprimento contratual do fornecedor;
  • Rejeição ou devolução de produtos entregues, com fundamento na menor qualidade de parte ou da totalidade da encomenda ou no atraso da entrega, sem que seja demonstrada, pelo comprador, a responsabilidade do fornecedor por esse facto;
  • Recusa de confirmação por escrito dos termos de um acordo, quando tal tenha sido expressamente solicitado pelo fornecedor, exceto nas transações comerciais entre as cooperativas ou as organizações de produtores e respetivas associações,reconhecidas e os seus respetivos membros, sempre que os respetivos estatutos ou decisões deles decorrentes incluam disposições de efeito semelhante aos termos do acordo de fornecimento.

São práticas negociais proibidas no setor agroalimentar as seguintes práticas negociais no âmbito de transações comerciais que tenham por objeto produtos agrícolas ou alimentares, salvo se as mesmas tiverem sido previamente estipuladas de forma clara e inequívoca no acordo de fornecimento ou em qualquer acordo posteriormente celebrado entre o fornecedor e o comprador:

  • Devolução pelo comprador de produtos não vendidos, sem efetuar o pagamento desses produtos, ou o pagamento do respetivo escoamento, ou de ambos;
  • Cobrança ao fornecedor de um pagamento como condição pelo armazenamento, exposição ou inclusão no inventário dos seus produtos, ou pela disponibilização desses produtos no mercado;
  • Exigência de que o fornecedor assuma a totalidade ou parte do custo dos descontos de produtos vendidos pelo comprador como parte de uma promoção, salvo se o comprador especificar antecipadamente ao início da promoção o período dessa promoção e a quantidade de produtos que prevê encomendar ao preço com desconto;
  • Exigência de pagamento por parte do fornecedor por publicidade aos seus produtos ou por ações de comercialização que tenham sido efetuadas pelo comprador;
  • Cobrança pelo comprador de remuneração devida a pessoal para arranjo das instalações utilizadas para a venda dos produtos do fornecedor;
  • Se forem acordados pagamentos o comprador deve facultar, por escrito, uma estimativa dos pagamentos por unidade ou globais e nalguns casos também uma estimativa dos custos e das bases dessa estimativa, se for requerido pelo fornecedor.

As novas regras são aplicáveis aos contratos celebrados com:

  • fornecedores singulares ou coletivos do setor agroalimentar, independentemente do Estado-Membro da União Europeia em que estejam estabelecidos, bem como às organizações de produtores e respetivas associações reconhecidas;
  • compradores singulares ou coletivos de produtos agrícolas e alimentares ou agrupamentos destes, independentemente do Estado-Membro da União Europeia em que se encontrem estabelecidos, ou com compradores que sejam entidades públicas, entendendo-se como tal os serviços e entidades que integram a administração direta, indireta e autónoma do Estado, incluindo os serviços e entidades da administração regional, local e associações públicas sujeitos a um regime de direito público.

 

 

Referências
Decreto-Lei n.º 76/2021 - DR n.º 167/2021, Série I de 27.08.2021
Diretiva (UE) n.º 2019/633 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17.04.2019
Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão Europeia, de 06.05.2003
Decreto-Lei n.º 62/2013 . D.R. n.º 90, Série I de 2013-05-10
Regulamento (UE) n.º 1308/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17-12-2013, artigo 172.º-A
Decreto-Lei n.º 118/2010, de 25 de outubro, artigos 1.º, 2.º e 4.º a 6.º-A
Código Comercial, artigo 102.º


 


 

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