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Regulamentado acesso às «barrigas de aluguer»


Foi regulamentado o acesso à gestação de substituição, cujas regras entraram em vigor em setembro de 2016, mas dependiam desta regulamentação para poderem ser aplicadas.

Assim, entra hoje em vigor, 1 de agosto, o novo decreto regulamentar que define o procedimento de autorização prévia a que se encontra sujeita a celebração de negócios jurídicos de gestação de substituição, o conteúdo mínimo do contrato, o regime de proteção de parentalidade aplicável à gestante e ao casal beneficiário, a consideração dos interesses da mulher gestante. O diploma será objeto de avaliação dentro de um ano.

Entra também hoje em aplicação a lei que regula o acesso à gestação de substituição e alterou em agosto do ano passado a lei da procriação medicamente assistida (PMA), incluindo a validade e sanções no âmbito de contratos de gestação de substituição.

A 1 de setembro do ano passado, a lei da PMA passou a permitir o acesso à gestação de substituição em três casos excecionais: ausência de útero, lesão deste órgão ou doença que impeça de forma absoluta e definitiva a gravidez. Desde 26 de julho de 2017 que estão em vigor as novas regras no âmbito da PMA que definem o destino dos espermatozoides, ovócitos, tecido testicular e tecido ovárico não utilizados, prevendo-se o prazo para a sua criopreservados.

Essas regras surgiram por recomendação da Comissão encarregue da regulamentação relativa à PMA que, antecipando o aumento da criopreservação resultante da nova abrangência da lei, aconselhou a regular o destino de espermatozoides, ovócitos, tecido testicular e tecido ovárico criopreservados, pois a lei apenas previa o destino dos embriões não utilizados.

Os mesmos especialistas envolvidos na regulamentação do acesso das mulheres às técnicas de PMA, independentemente do diagnóstico de infertilidade são agora responsáveis pela regulamentação da gestação de substituição.

Principais características

O contrato deve prever o acompanhamento psicológico antes e após o parto da gestante de substituição, para prevenir de possíveis complicações físicas e psicológicas, bem como assegurar a máxima segurança médica possível e envolvimento de todas as partes.

Ao longo do processo de gestação de substituição, é privilegiada a ligação da mãe genética com a criança, nomeadamente no âmbito da celebração e da execução do próprio contrato; a relação da gestante de substituição com a criança nascida limita-se ao mínimo indispensável, pelos potenciais riscos psicológicos e afetivos que essa relação comporta.

Nas situações em que a gestante de substituição seja uma familiar próxima, subsistirá sempre a relação habitual entre ambas.

As decisões devem basear-se na tutela de interesses comuns e, em especial, dos interesses da criança.

A regulamentação garante ainda a igualdade de tratamento no recurso às técnicas de PMA, incluindo no contexto do Serviço Nacional de Saúde (SNS), entre os beneficiários desta alternativa terapêutica e os beneficiários que reúnam os requisitos legais do regime de acesso à PMA.

PMA no SNS

O acesso a técnicas de PMA no âmbito do Serviço Nacional de Saúde (SNS) pelo casal beneficiário e a gestante de substituição segue os mesmos critérios aplicados aos beneficiários com acesso a técnicas de PMA ao abrigo da respetiva lei de 2006 e as suas alterações de 2016, que alargaram o âmbito dos beneficiários das técnicas de PMA e definiram as regras do acesso à gestação de substituição.

Assim, os critérios de acesso no SNS às técnicas PMA no âmbito das situações de gestação de substituição são os seguintes:

  • beneficiários:
    - podem recorrer às técnicas de PMA os casais de sexo diferente ou os casais de mulheres, respetivamente casados ou casadas ou que vivam em condições análogas às dos cônjuges, bem como todas as mulheres independentemente do estado civil e da respetiva orientação sexual;
    - só podem ser utilizadas em benefício de quem tenha, pelo menos, 18 anos de idade e não se encontre interdito ou inabilitado por anomalia psíquica;
  • recurso às técnicas PMA:
    - podem ainda ser utilizadas por todas as mulheres independentemente do diagnóstico de infertilidade;
    - são usadas como método de procriação mediante diagnóstico de infertilidade ou para tratamento de doença grave ou do risco de transmissão de doenças de origem genética, infeciosa ou outras;
  • centros autorizados e pessoas qualificadas: as técnicas de PMA, incluindo as realizadas no âmbito das situações de gestação de substituição, só podem ser ministradas em centros públicos ou privados expressamente autorizados para o efeito pelo Ministro da Saúde.

Também os tempos de espera têm de ser os mesmos. Assim, o acesso às técnicas de PMA no SNS pelo casal e pela gestante de substituição não pode ser objeto de tempos de espera distintos dos aplicáveis aos outros beneficiários fora do SNS.

Regime de proteção de parentalidade

Em matéria de proteção de parentalidade, os efeitos da gestação de substituição são os seguintes:

  • em relação ao casal beneficiário: para efeitos de licença parental, no âmbito da aplicação do regime de proteção de parentalidade, o parto da gestante de substituição é considerado como respeitante ao casal beneficiário;
  • em relação à gestante de substituição: o seu parto beneficia de regime equivalente ao da interrupção da gravidez, no âmbito do regime de proteção de parentalidade, que se aplica quer a trabalhadoras por conta de outrem quer a trabalhadoras independentes;
  • faltas e dispensas: o regime das faltas e dispensas relativas à proteção na parentalidade é aplicável à gestante de substituição, bem como ao casal beneficiário na qualidade de pais da criança.

Pedido de autorização prévia

O pedido de autorização prévia para celebrar contratos de gestação de substituição é apresentado ao CNPMA através de um formulário disponível no site desta entidade, que deve ser subscrito conjuntamente pelo casal beneficiário e pela gestante de substituição.

Com o pedido deve ser enviada a seguinte documentação e informação:

  • identificação do casal beneficiário e da gestante de substituição, escolhida por aquele casal;
  • aceitação das condições previstas no contrato-tipo de gestação de substituição por parte do casal beneficiário e da gestante de substituição;
  • documentação médica, com origem no centro de PMA no qual se efetuará a técnica para a gestação de substituição, que comprove que a mulher elemento do casal beneficiário se encontra nas condições legalmente previstas (lesão, doença ou ausência de útero ou outra situação clínica que o justifique, e recurso aos gâmetas de, pelo menos, um dos beneficiários na técnica de PMA);
  • declaração de psiquiatra ou psicólogo favorável à celebração do contrato de gestação de substituição;
  • declaração do Diretor do centro de PMA no qual a técnica de PMA necessária seja efetuada, aceitando a concretização nesse centro do tratamento.

O processo poderá demorar cerca de seis meses.

O CNPMA decide no prazo máximo de 60 dias a contar da apresentação do pedido e envia a documentação médica à Ordem dos Médicos para parecer, que terá de ser apresentado também em 60 dias. Este parecer da Ordem não tem carácter vinculativo, sendo que na sua falta o procedimento prossegue sem ele.

Recebendo o parecer da Ordem dos Médicos (ou findos os 60 dias que esta tem para o emitir) o CNPMA tem mais 60 dias para decidir se autoriza ou rejeita a celebração do contrato de gestação de substituição. Para isso pode inclusivamente reunir com a gestante de substituição e o casal beneficiário, ou pedir uma avaliação independente dos envolvidos, nomeadamente na área da saúde materna e da saúde mental.

Contrato de gestação de substituição

As declarações negociais da gestante de substituição e dos beneficiários, manifestadas no contrato de gestação de substituição, são livremente revogáveis até ao início dos processos terapêuticos de PMA, sem prejuízo do previsto pelo Código Penal em matéria de interrupção da gravidez não punível quando realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas de gravidez.

O contrato-tipo de gestação de substituição é aprovado pelo CNPMA; contém os elementos essenciais do contrato e deve ser disponibilizando no site desta entidade.

Podem ainda ser aditadas cláusulas ao contrato-tipo, por acordo das partes.

Do contrato-tipo devem constar cláusulas que tenham por objeto certos direitos e obrigações, bem como vicissitudes que possam ocorrer no âmbito do procedimento:

  • as obrigações da gestante de substituição no que respeita ao cumprimento das orientações médicas do obstetra que segue a gravidez e a realização dos exames e atos terapêuticos por este considerados indispensáveis ao correto acompanhamento clínico da gravidez, tendo em vista assegurar a evolução normal da gravidez e o bem-estar da criança;
  • os direitos da gestante de substituição na participação nas decisões referentes à escolha do obstetra que segue a gravidez, do tipo de parto e do local onde o mesmo terá lugar;
  • o direito da gestante de substituição a acompanhamento psicológico antes e após o parto;
  • as obrigações e os direitos da gestante de substituição, tais como a possibilidade de recusa de se submeter a exames de diagnóstico, como a amniocentese, ou a possibilidade de realizar viagens em determinados meios de transporte ou fora do país no terceiro trimestre de gestação;
  • prestação de informação sobre as técnicas clínicas e os seus potenciais riscos para a saúde, que tem de ser completa e adequada;
  • prestação de informação sobre a influência do estilo de vida da gestante no desenvolvimento embrionário e fetal, significado e suas consequências, quer ao casal beneficiário quer à gestante de substituição;
  • disposições a observar sobre quaisquer intercorrências de saúde ocorridas na gestação, quer a nível fetal, quer a nível da gestante de substituição;
  • regras a cumprir em caso de eventual interrupção voluntária da gravidez em conformidade com a legislação em vigor;
  • possibilidade de denúncia do contrato por qualquer das partes, no caso de se vir a verificar um determinado número de tentativas de gravidez falhadas e em que termos tal denúncia pode ter lugar;
  • termos de revogação do consentimento ou do contrato e a suas consequências;
  • gratuitidade do negócio jurídico e a ausência de qualquer tipo de imposição, pagamento ou doação por parte do casal beneficiário a favor da gestante de substituição por causa da gestação da criança, para além do valor correspondente às despesas decorrentes do acompanhamento de saúde efetivamente prestado, incluindo em transportes;
  • os subsistemas ou seguros de saúde que podem estar associados ao objeto de contrato;
  • forma de resolução de conflitos a adotar pelas partes em caso de divergência que se suscite sobre a interpretação ou execução do negócio jurídico.

 

Referências
Decreto Regulamentar n.º 6/2017, de 31 de julho
Decreto Regulamentar n.º 6/2016, de 29 de dezembro
Lei n.º 25/2016, de 22 de agosto
Lei n.º 17/2016, de 20 de junho
Lei n.º 32/2006, de 26 de julho
Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de abril
Código Penal, artigo 142.º, n.º 1, alínea e)

 

 

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08.08.2017